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Equilíbrio

Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


Diferença entre gêmeos ajuda a entender como ambiente afeta o comportamento

Em geral, 50% da personalidade é determinada pela genética e o restante é moldado pelo ambiente em que vivemos - NYT
Em geral, 50% da personalidade é determinada pela genética e o restante é moldado pelo ambiente em que vivemos Imagem: NYT

Jane E. Brody

Do New York Times

25/08/2018 10h34

No dia em que meus meninos, gêmeos idênticos, nasceram de uma cesariana de emergência, notei uma diferença de comportamento. O Gêmeo A, que tinha sido espremido por várias horas contra a pélvis inflexível, passou a maior parte de seu primeiro dia alerta, olhando em volta; enquanto o Gêmeo B, que fora poupado desse estresse pré-nascimento, dormia calmamente, como um típico recém-nascido.

Meu marido e eu fizemos o possível para tratá-los de forma igual, mas ninar o Gêmeo A era um desafio --nós o chamávamos de "bebê lagosta". Já o Gêmeo B se aconchegava mais facilmente. Conforme iam crescendo, notamos outras diferenças: o B ensaiou todas as etapas do processo de aprender a andar, enquanto o irmão assistia e, em seguida, copiava a habilidade quando era dominada.

Embora compartilhassem genes e crescessem com os mesmos pais, havia diferenças nos dois que foram influenciadas por outros fatores em seu ambiente pré e pós-natal.

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A importância relativa da natureza e do ambiente na maneira em que uma criança se desenvolve é debatida há séculos, e tem forte influência sobre políticas públicas.

O programa Head Start, por exemplo, bem-intencionado, foi projetado para dar uma vantagem acadêmica às crianças de ambientes carentes, mas ensinar os responsáveis a cuidar e a incentivar habilidades dos pequenos, a enriquecer seu ambiente e a orientar sobre más influências.

As crianças aprendem com o que veem ao seu redor, e se o que experimentam é principalmente a violência, o abuso, a evasão escolar e a falta de expectativas para o sucesso, suas chances de um futuro saudável são rapidamente comprometidas. Como meu filho Erik Engquist, um colega jornalista que era um Gêmeo A, disse: "Os genes definem seu potencial, mas o ambiente determina em grande medida como você se transforma. Os poucos que escapam de influências negativas são exceções."

Entretanto, se o potencial genético está lá, até mesmo um único adulto carinhoso e incentivador na vida de uma criança pode fazer a diferença no crescimento.

Como contou minha cunhada Cindy Brody, tanto sua bisavó quanto sua avó escaparam de relacionamentos abusivos e deixaram seus filhos serem criados pela família e por amigos. A mãe de Cindy acabou com pais adotivos carinhosos e ela, por sua vez, amou e cuidou de suas duas filhas, mas morreu quando Cindy tinha apenas oito anos, deixando a ela e a sua irmã "com um pai frio, agressivo, rigoroso e que acreditava em punição corporal", que acabou se casando com uma mulher cujos dois filhos atacaram sexualmente as meninas.

Cindy fugiu de casa aos 17 anos, determinada a "nunca mais deixar ninguém me machucar". Impulsionada por uma força interior e o carinho, a força e a independência promovidos pelas mulheres em sua vida --mãe, avó e uma tia --, Cindy disse que conseguiu cuidar de si mesma, arrumar um bom trabalho, viver seus sonhos e ser uma mãe amorosa para seus próprios filhos.

Longos estudos de gêmeos idênticos e fraternos --e, em alguns casos, trigêmeos -- que foram separados em tenra idade e muitas vezes criados em ambientes surpreendentemente diferentes, mostram a importante interação da natureza e dos cuidados, e ajudam a explicar as contribuições relativas de cada aspecto para o desenvolvimento de uma criança.

"A estrita dicotomia entre genes e ambiente não é mais relevante; eles trabalham juntos", disse Nancy Segal, psicóloga da Universidade Estadual da Califórnia em Fullerton (EUA), ela mesma, gêmea fraterna que fez carreira estudando essas crianças, começando com o Estudo de Famílias de Gêmeos de Minnesota. Segal é autora de "Born Together ? Reared Apart: The Landmark Minnesota Twins Study", publicado em 2012.

Os numerosos estudos de milhares de gêmeos idênticos e fraternos, tanto os criados juntos quanto os que se separaram, possibilitaram avaliar as contribuições relativas dos genes e do ambiente de um grande número de características.

"É específico de cada traço", disse Segal, com diferentes proporções, dependendo da característica em questão. "Em um indivíduo, as contribuições genéticas e ambientais são inestimáveis, mas em uma base populacional podemos avaliar o quanto a variação de pessoa a pessoa é explicada por diferenças genéticas e ambientais."

Os estudos de gêmeos criados separadamente mostram que, em geral, 50% das diferenças de personalidade e religiosidade são determinadas geneticamente, mas para uma característica como o QI, cerca de 75% da variação, em média, é genética, com apenas 25% influenciados pelo ambiente.

Além disso, pode haver diferenças de gênero na influência da genética. Um estudo de quatro mil pares de gêmeos na Suécia descobriu que ela tem uma influência mais forte na orientação sexual em gêmeos masculinos do que nos femininos.

Como observei em meus próprios filhos e aprendi com estudos de doenças cardíacas, os genes garantem um potencial, mas o ambiente determina frequentemente se esse potencial se desenvolve. Por exemplo, uma voz afinada normalmente é um traço familiar e pode até estar vinculada a um único gene, mas sem o treinamento musical precoce, a característica provavelmente não será notada.

No documentário "Three Identical Strangers", sobre meninos trigêmeos idênticos separados ao nascer, havia diferenças em sua suscetibilidade à doença mental, com aquele que foi criado por um pai autoritário mais gravemente afetado do que os outros dois, com pais mais carinhosos e protetores.

Os geneticistas agora sabem que, embora o DNA de um indivíduo seja essencialmente imutável, uma ampla gama de fatores ambientais pode conferir as chamadas diferenças epigenéticas, que influencia quais genes no genoma de um indivíduo podem ser ativados ou desligados. Já foi mostrado que fatores como exercício, sono, trauma, envelhecimento, estresse, doença e dieta têm efeitos epigenéticos, alguns dos quais podem ser passados para as gerações futuras.

Pesquisadores estão buscando maneiras de alterar a expressão gênica na esperança de encontrar métodos de prevenção ou tratamento para doenças, como o diabetes, que têm um componente genético forte.

Também pode haver mudanças no genoma de um gêmeo idêntico quando o ovo se divide, resultando em um defeito de um determinado gene, segundo Segal. Em meninas gêmeas idênticas, uma delas pode apresentar um fenômeno chamado inativação ligada ao X. Duas das meninas de Dionne, nascidas de um parto quíntuplo, eram daltônicas, resultado de um efeito genético.

Segal, que também escreveu "Twin Misconceptions: False Beliefs, Fables and Facts About Twins", disse que os estudos destacam a importância de manter gêmeos, especialmente os idênticos, juntos quando adotados. Em relação ao documentário, ela disse: "Os trigêmeos se ressentiam profundamente de terem sido separados. Eles perderam anos maravilhosos que poderiam ter vivenciado juntos. Houve um vínculo imediato, uma compreensão um do outro, algo óbvio, logo que se encontraram".

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