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Equilíbrio

Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


Sentimento de culpa faz crianças terem mais empatia

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Imagem: iStock

Dra. Perri Klass

Do The New York Times

11/12/2017 09h14

A culpa pode ser um elemento complicado na relação entre pais e filhos. Sentimos culpa, eles sentem culpa, podemos fazer com que sintam culpa e então nos sentimos culpados por causa disso. Alguns tipos de culpa, porém, são parte do desenvolvimento saudável das crianças.

Tina Malti, professora de Psicologia da Universidade de Toronto que estudou o desenvolvimento da culpa em crianças, considera esse sentimento uma emoção parecida com a empatia.

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"A culpa moral é saudável, boa de desenvolver. Ajuda a criança a não cometer agressões nem ter comportamentos antissociais", afirma ela.

Uma criança que faz outra chorar pode ter uma reação empática, explica, e se sentir mal porque a outra está triste. Ou é capaz de se sentir culpada porque o que quer que tenha feito para a outra violou seus próprios padrões de certo e errado. "Essas duas reações podem ser totalmente independentes ou acontecer juntas."

Existe um caminho de desenvolvimento da culpa, explica Malti. Crianças até mais ou menos os seis anos que choram ao quebrar um brinquedo, talvez não entendam profundamente a perspectiva das outras pessoas a ponto de experimentar emoções mais complexas de culpa. Depois dessa idade, diz ela, a maioria das crianças relata sentir culpa em resposta a transgressões, e isso pode fazer com que elas tratem outras pessoas de maneira mais gentil. "Há várias evidências de que a culpa saudável promove o comportamento social das crianças", afirma.

Culpa x vergonha

Essa é outra área em que nossos pais e avós provavelmente viveram mais facilmente do que os pais de hoje – em geral, eles não se preocupavam tanto quando faziam seus filhos se sentirem culpados. Eles talvez até tenham usado a palavra vergonha em frases como: "Você deveria se envergonhar do que fez".

Não sei sobre o leitor, mas essa expressão não fez parte do meu arsenal de pai. Se algum dia disse isso, provavelmente me senti, claro, culpado.

A distinção usual é que a culpa é a emoção interna, que você sente quando sabe que fez algo errado ou causou danos. A vergonha é externa, é o que você sente com o julgamento de outros membros da família ou da sociedade que sabem de sua transgressão. Mas essa distinção é um pouco simplista, segundo Roy Richard Grinker, professor de Antropologia da Universidade George Washington, porque, para ele, na ausência de um público, podemos sentir vergonha apenas por imaginá-lo. Parte de crescer dentro de uma cultura é "um tipo de internalização dos valores que essa sociedade possui", explica.

Para Colin Leach, professor de Psicologia na Universidade de Connecticut, culpa e vergonha são termos pesados. "O que realmente importa é a maneira como os adultos e as crianças pensam sobre suas falhas e percalços, o quanto acreditam que eles mesmos ou seus relacionamentos podem melhorar com algum esforço", afirma.

Mãe; criança; culpa - iStock - iStock
Pais podem nutrir o desenvolvimento da consciência e da moral e ao mesmo tempo evitar que as crianças fiquem atormentadas
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Quando se preocupar

A doutora Helen Egger, presidente do departamento de Psiquiatria Infantil e Adolescente da NYU Langone Health, diz que a culpa reflete o que é chamado de "teoria da mente", ou seja, o desenvolvimento do entendimento na criança de que outras pessoas possuem sentimentos e pontos de vistas. "As crianças precisam desenvolver uma teoria da mente, própria e dos outros, para poder sentir culpa." E raramente, se isso não acontece, conta, "quando você tem mentiras ou falta de culpa, a criança parece ter uma capacidade reduzida de sentir empatia".

Segundo ela, os pais devem se preocupar, por exemplo, quando um filho mostra um padrão de agressão deliberada, batendo em outra criança para conseguir o que quer, em vez de por raiva, e não responde ao sofrimento de quem foi agredido.

A culpa é parte do desenvolvimento normal da criança, e na verdade não queremos ver os pequenos crescerem sem ela, mas também nos preocupamos com a possibilidade de eles se julgarem de modo muito duro ou se sentirem responsáveis por coisas que estão além de seu controle (o exemplo clássico se culpar pela briga ou pelo divórcio dos pais).

Com crianças menores, segundo Egger, a culpa pode vir misturada com pensamento mágico e a sensação de onipotência, como acontece quando elas se acreditam responsáveis pela doença ou deficiência de um irmão. À medida que crescem, esse tipo de preocupação pode estar ligado a problemas de ansiedade, diz ela, especialmente a transtornos de ansiedade generalizada, em que a criança tem uma sensação de estar quase sempre ansiosa, procurando ameaças e também se sentindo responsável.

Crianças pequenas com ansiedade correm maior risco de desenvolver sintomas depressivos. "A culpa esmagadora é um sintoma chave da depressão", afirma Egger.

Criança; empatia - iStock - iStock
Uma criança que faz outra chorar pode sentir empatia pela outra que está triste
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Como fazer seu filho entender a culpa

Então, como os pais podem nutrir o desenvolvimento da consciência e da moral e ao mesmo tempo evitar que as crianças fiquem atormentadas? A culpa, quando é construtiva, deve dar à criança uma sensação apropriada de poder e de dever, uma determinação realística de fazer as coisas de modo diferente. O foco deve estar nas ações específicas e não na personalidade da criança; a mensagem não é que há algo errado com ela, mas que ela escolheu fazer o que não devia e isso teve certos resultados.

Malti fala sobre "indução" de culpa, em que os pais explicam as consequências das ações de maneira clara: "Seu irmão está chorando porque você quebrou o brinquedo dele". Como médica, ela trabalhou com crianças que demonstravam não sentir culpa, e nesses casos a indução pode ser muito útil. Por outro lado, ela também lidou com outras que sentiam uma culpa desproporcional, que se acreditavam responsáveis pelo sofrimento de outras pessoas, algo fora de seu controle.

"Se os pais estão brigando é importante dizer que isso não tem relação com o comportamento da criança", afirma Malti. De outra maneira, o filho pode continuar a se preocupar e "isso pode levar a um tipo mais existencial de ansiedade ou à depressão".

As crianças precisam ser capazes de perceber em seus comportamentos e relacionamentos o que é verdadeiramente sua responsabilidade. "Elas devem ter um indicador preciso. Pode ser até motivador nos sentirmos um pouco mal sobre algo, mas ficar ruminando retrospectivamente sobre onde falhamos ou ficar paralisado por causa disso tende a não ser produtivo e pode se tornar muito doloroso e prejudicial psicologicamente", diz Leach.

Segundo ele, algumas crianças, assim como adultos, têm mais propensão aos pensamentos negativos e a se culpar: "Não consigo fazer nada direito... Por que eu sempre...?". Pais e professores devem pensar como responder aos erros, porque a linguagem que os adultos usam tem o poder de interromper ou de reforçar a maneira negativa de pensar da criança. "Evite uma linguagem que envia aos pequenos a mensagem de que algo está errado com ele, em vez de dar lhes estratégias concretas para agir melhor no futuro."

"Algumas vezes, crianças e adultos não se responsabilizam o suficiente. E alguns se culpam demais", diz Leach.

"Crianças normalmente se sentem mal quando fazem algo para ferir o outro ou alguma coisa errada. O foco não deve estar em fazer a pessoa se sentir culpada", explica Egger. O passo mais importante no desenvolvimento, segundo ela, é a capacidade de distinguir o certo do errado, de se comportar da maneira correta e, quando não fizer isso, reparar o erro com honestidade e clareza.

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