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Blog do Luiz Sperry

Bebedeira e ressaca são faces da mesma moeda: o que o álcool causa no corpo

Luiz Sperry

01/01/2018 04h00

Crédito: iStock

Se você aproveitou as festas de final de ano com tudo, é grande a chance de você ainda estar de ressaca. O álcool é, sem dúvida, a droga que acompanha há mais tempo a humanidade: são quase 10.000 anos de parceria. É atualmente a mais disseminada no mundo e aquela com maior impacto em nossa saúde. Mas o que o álcool faz com o corpo exatamente? E o que nosso organismo faz para lidar com essa toxina que insistimos em ingerir através de tantas gerações?

O álcool apresenta uma série de conveniências que permitiram que ele se inserisse na sociedade de modo tão arraigado. Historicamente, trazia a vantagem de ser uma bebida calórica (lembrem-se: antigamente, ser calórico era bom, já que as pessoas muitas vezes morriam de fome) e relativamente segura, uma vez que não havia água potável. A chance de você ficar doente bebendo cerveja era menor do que bebendo água.

Mas o que fez com que o álcool caísse nas graças do homem foi sua ação psicoativa. O álcool age no cérebro por meio de um neurotransmissor chamado ácido gama-amino-butírico, GABA, para os íntimos. O GABA é super importante, pois é responsável por desativar uma grande quantidade de sistemas cerebrais. É o que a gente percebe quando começa a beber. Primeiro desliga a nossa inibição, depois o controle da voz, seguido pelo senso de vergonha, atingindo a coordenação motora, a dignidade e por aí vai. Se você continuar bebendo, entra em coma, que é o equivalente neurológico de desligar a chave geral.

Claro que, se a gente fizer isso com algum método, pode ser muito gostoso –e geralmente é, porque continuamos a beber, de forma moderada ou não. O álcool, assim como as outras drogas que usamos, ativa nosso princípio do prazer, e consequentemente, tendemos a repetir estas experiências.

Por outro lado, o álcool é bastante tóxico. Coração, pâncreas, fígado, cérebro, quase nada escapa dos efeitos tóxicos do etanol. Então, nosso organismo vem se modificando nesses 10.000 anos para conseguir metabolizar o álcool e evitar que ele destrua nosso corpo. O órgão responsável por isso, claro, é o fígado. O fígado tenta transformar o álcool em outras substâncias, de modo que elas possam ser eliminadas do nosso corpo. Se a gente não metabolizasse o álcool, uma pequena dose seria suficiente para deixar a gente muito bêbado por muito tempo –e isso poderia ser fatal.

Mas graças ao nosso fígado a gente pode beber bastante, em relativa segurança. O problema é que um dos metabólitos do álcool é o acetaldeído, responsável por grande parte do mal-estar que chamamos de ressaca. Quando bebemos civilizadamente, nosso organismo consegue se livrar do acetaldeído antes de ele fazer mal. Mas quando a gente bebe muito rápido ou em grande quantidade, ele se acumula no organismo, causando a sensação de dores, fadiga, náusea e aquele gosto peculiar de corrimão de asilo que não sai da boca.

Vários tratamentos foram testados para curar a ressaca. Existem muitas lendas e alguns fatos. O tipo de bebida pouco importa, apesar de alguns tipos de vinhos e destilados estarem associados a mais sintomas. Beber água junto com a bebida ajuda um pouco, porque parte da ressaca também é efeito da desidratação causada pelo álcool. Mas o que funciona mesmo é beber pouco. E beber devagar.

A ressaca ativa nosso princípio de desprazer. Provavelmente tem um monte de gente hoje dizendo que nunca mais vai beber, porque também é tendência nossa se afastar daquilo que nos faz mal. Estudos demonstram que quem não sente ressaca tem uma propensão muito maior ao alcoolismo.

Bebendo ou não, um feliz 2018 para todos!

Beba com moderação. E se for beber, não dirija.

 

Sobre o autor

Luiz Sperry é médico psiquiatra formado pela USP em 2003. Adora a cidade de São Paulo, onde nasceu e cresceu. Já trabalhou nos 4 cantos dela, inclusive plantão em pronto-socorro (tipo ER mesmo), Unidade Básica, HC, Emílio Ribas, hospícios e hospitais gerais. Foi professor de psicopatologia na Faculdade Paulista de Serviço Social e hoje em dia trabalha em consultório e supervisiona residentes do HC.

Sobre o blog

Um espaço para falar das coisas psi em interface com o que acontece no dia a dia, trazendo temas da atualidade sem ser bitolado.

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