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Paola Machado

Qual é o melhor horário para treinar?

Paola Machado

03/04/2018 04h00

Qual o melhor horário para treinar

Crédito: iStock

Está aí uma dúvida de muitas pessoas: "Será que é melhor fazer meu exercício quando acordo, de tarde ou à noite?". Bom, isso depende da sua agenda, de fatores ambientais (temperatura, luz) e do organismo de cada um. Sim, no fundinho, você sabe qual é o horário em que seu corpo costuma estar mais disposto.

O que é importante entender é que nosso desempenho muda, ciclicamente, durante o dia todo, o que podemos chamar de "ritmo circadiano". Esses ritmos, em repouso, são controlados pelo nosso "relógio biológico".

De acordo com uma revisão de literatura publicada pela Revista Brasileira de Ciência e Movimento, realizada por Marco Túlio de Mello e pesquisadores, sobre ritmo circadiano e desempenho físico, a performance depende do seguinte:

Temperatura corporal

A temperatura corporal atinge o mínimo valor (36 ºC) no período de sono, em torno das 4 h da manhã, aumenta durante o dia e atinge seu pico (38,5 °C) no final da tarde, por volta das 18 h. Durante o exercício, 80% da energia usada nas contrações musculares podem ser dissipadas sob a forma de calor. Assim, o desempenho está relacionado ao horário em que a temperatura corporal atinge seu pico, pois coincide com o pico do consumo de oxigênio, a taxa de ventilação e metabólica, que ocorrem entre 15 h e 21 h.

Com isso, estudos mostram que há relações positivas entre bom desempenho, temperatura corporal mais elevada e vigília subjetiva. E há relações negativas entre bom desempenho, alto nível de cortisol (hormônio estressante) e de melatonina (hormônio que induz o sono, secretado entre 21 h e 7 h).

Ritmos circadianos de repouso e durante o exercício

A frequência cardíaca varia durante o dia de 5% a 15%, dependendo de muitos fatores, como sono, postura, nível de atividade física e dieta. Seu pico ocorre por volta das 15 h, sendo mais baixa durante a noite.

O consumo de oxigênio, importantíssimo marcador de desempenho físico, tem seu pico entre 15 h e 19 h, sendo influenciado pela temperatura corporal.

O hormônio do crescimento (GH) atinge seu pico durante o sono e depende do nível de atividade física, sendo que ocorre maior liberação em exercícios de intensidades relativas (depende da duração e intensidade).

As catecolaminas –noradrenalina e adrenalina — influenciam no desempenho pela produção e liberação de calor. Enquanto a noradrenalina aumenta em exercícios de 40 a 60% do consumo máximo de oxigênio (ritmo moderado), os níveis de adrenalina permanecem inalterados até que a intensidade do exercício exceda aproximadamente os 60% do consumo máximo de oxigênio (ritmo forte).

O humor e o estado de alerta influenciam no desempenho. Evidências mostram que o estado de alerta, bem-estar, fadiga mínima e humor atingem o pico de tarde e no início da noite. Já tarefas cognitivas são melhores realizadas após o almoço.

Variações pelas horas do dia

Quando acordamos e durante o decorrer do dia, nosso desempenho melhora até um limiar, sendo que, a partir de certo ponto, começa a decair. Alguns estudos mostram que o melhor condicionamento físico ocorre em treinos realizados no final da tarde e início da noite, podendo ser mais seguro e causar menos desconforto.

Tipo de exercício

De acordo com algumas pesquisas, os exercícios de flexibilidade tem uma resposta melhor entre 12 h e 24 h. Já treinos de força muscular, potência anaeróbia e esforços explosivos atingem o melhor desempenho no final da tarde e período da noite, talvez porque o desempenho noturno pode ser atribuído a uma maior tolerância a altas intensidades e uma correlação com a maior temperatura corporal.

Pode-se observar que os recordes mundiais nos esportes são usualmente quebrados por atletas competindo no início da noite, exatamente no horário no qual a temperatura corporal é maior.

Um estudo mostra que, em exercícios com intensidade abaixo do limiar ventilatório, a percepção de esforço foi a mesma tanto pela manhã quanto no período da tarde. Porém, acima do limiar a taxa de trabalho foi percebida como menos cansativa no período da manhã, sendo que cerca de 20% dessa diferença pode ser explicada pela menor demanda ventilatória nesse período.

Individualidade biológica

Ser uma pessoa matutina, vespertina ou intermediária parece não influenciar no desempenho físico. Porém, isso interfere em outros fatores que afetam a performance. Indivíduos matutinos têm um pico de temperatura corporal mais cedo que os vespertinos, sendo que o alerta nos matutinos diminui após o almoço e também há uma queda do desempenho físico. Já o consumo de oxigênio dos vespertinos parece ser maior à noite.

Sono

Já sabemos que o sono é importantíssimo para a recuperação. Uma noite bem dormida traz diversos benefícios. Se você tem dificuldade para dormir, evite praticar exercícios intensos antes de se deitar, pois eles liberam adrenalina e atrasam a produção de melatonina, dificultando o sono.

Ingestão de drogas, álcool, cafeína ou medicamentos

A sensibilidade do organismo à ingestão dessas substância é diferente em algumas horas do dia, o que pode influenciar diretamente o rendimento e o desempenho do indivíduo.

Algumas informações como o melhor horário para obter um desempenho físico árduo, a programação das refeições, o conhecimento da percepção individual do esforço e noções sobre os efeitos negativos da perda de sono podem auxiliar a população adepta ao exercício a melhorar o desempenho no treinamento.

Dito isso, é muito importante ressaltar que, acima de todos esses fatores, devemos respeitar nossa individualidade biológica.

Você conhece seu relógio biológico melhor do que qualquer outra pessoa. Você também sabe da sua rotina, sendo que conseguirá encaixar o exercício no seu melhor horário e no horário que estiver mais disposto.  Você, mais do que ninguém, se conhece e conhece seus limites. Sabe o que é melhor para o seu corpo! É uma questão de parar, refletir e pensar um pouco mais em você.

REFERÊNCIAS:
– Antunes, A.K.M.; et al. Sleep deprivation and exercise. Revista Brasileira de Medicina do Esporte. Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte, v. 14, n. 1, p. 51-56, 2008.
– Antunes, A.K.M.; et al. Reviewing on physical exercise and the cognitive function. Revista Brasileira de Medicina do Esporte. Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte, v. 12, n. 2, p. 108-114, 2006.
– Antunes, A.K.M.; et al. Exercise deprivation increases negative mood in exercise-addicted subjects and modifies their biochemical markers. Physiology & Behavior, v. 156, p. 182-190. Citações Web of Science: 8. 2016.
– Monico-Neto, M.; et al. Negative Energy Balance Induced by Paradoxical Sleep Deprivation Causes Multicompartmental Changes in Adipose Tissue and Skeletal Muscle. INTERNATIONAL JOURNAL OF ENDOCRINOLOGY, 2015. Citações Web of Science: 5. (98/14303-3, 11/15962-7, 13/00152-5).

Sobre a autora

Paola Machado é fisiologista do exercício, formada em educação física modalidade em saúde pela UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo), mestre em ciências da saúde (foco em fisiologia do exercício e imunologia) e doutoranda em nutrição pela UNIFESP. É autora do Livro Kilorias - Faça do #projetoverão seu estilo de vida (Editora Benvirá). Atualmente, atua como pesquisadora, desenvolvendo trabalhos científicos sobre obesidade, e tem um canal de desafios (30 Dias com Paola Machado) onde testa a teoria na prática. Também é fundadora do aplicativo aplicativo 12 semanas. CREF: 080213-G | SP

Sobre a coluna

Aqui eu compartilharei conteúdo sobre exercício e alimentação para ajudar você a encontrar o caminho para um estilo de vida mais saudável. Os textos são cientificamente embasados e selecionados da melhor forma possível, sempre para auxiliar no seu bem-estar. Mas, lembre-se: a informação profissional é só o primeiro passo da sua nova jornada. O restante do percurso depende 100% de você e da sua motivação para alcançar seu objetivo.