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Guilherme Giorelli

Dieta do tipo sanguíneo: mito ou verdade?

Guilherme Giorelli

21/04/2018 04h00

Crédito: iStock

Nosso sangue é composto de duas partes: uma líquida chamada de plasma e uma sólida que contém hemácias, leucócitos e plaquetas. O que determina o seu tipo sanguíneo (grupo A, B, AB ou O) é o tipo de proteína presente na superfície da hemácia. Essas proteínas são chamadas de antígenos. Por serem diferentes entre si, elas não permitem a transfusão sanguínea entre todos os grupos e talvez possam influenciar a maneira de metabolizar o alimento.

Com esse raciocínio fisiológico, em 1996 foi publicado o livro "Eat Right 4 Your Type", traduzido em português como "A Dieta do Tipo Sanguíneo". Foram vendidos mais de 7 milhões de exemplares e traduzido para mais de 60 línguas. Apesar do enorme sucesso de público, essa dieta nunca teve evidencias científicas como embasamento, apenas teorias nunca comprovadas.

A ideia proposta no livro é que analisar o tipo sanguíneo revela os hábitos alimentares dos nossos ancestrais e que, ao seguir este mesmo tipo de hábitos alimentares, nós conseguiríamos ter mais saúde e reduzir o risco de doenças cardiometabólicas como hipertensão e perder até 6 kg em um mês.

Desta forma se sugeriu:

Tipo 0 –  Perfil de Caçador – deveria seguir uma alimentação rica em proteína animal

Tipo A – Perfil Agrícola –  São estimulados a seguir uma alimentação vegetariana.

Tipo B – Perfil Nômade –  São estimulados o consumo de produtos derivados do leite

Tipo AB – Perfil Enigma –  O conselho seria uma alimentação intermediaria entre os alimentos do tipo A (vegetariano) e tipo B derivados do leite.

Bases Cientificas:

A variação do grupo sanguíneo ABO tem sido associada a diferenças no risco de doenças como trombose venosa, câncer de pele, ovário e gástrico. Alguns trabalhos demonstram que, quando submetidos a alimentação rica em gordura, pessoas com sangue tipo A ficam com maior nível de colesterol no sangue. Tal fato se justifica por haver uma menor atividade da enzima fostase alcalina intestinal, que atua na absorção do gordura.

Estudos têm demonstrado que os tipos sanguíneos têm impactos diferentes sobre as bactérias presentes no intestino. Por exemplo, a presença do antígeno B em pacientes com o tipo B ou AB, tem uma maior presença de bactérias como Eubacterium rectale, Clostridium coccoides, and Clostridium leptum. Teoricamente, o grupo sanguíneo pode alterar o processamento de nutrientes, modificando o metabolismo do microbioma intestinal humano.

Parece interessante, não é mesmo? Pensando nisso, pesquisadores do Canadá, realizaram o primeiro trabalho comparando os efeitos da dieta do tipo sanguíneo em pacientes com obesidade e sobrepeso e publicaram na revista do The American Society of Nutrition. O objetivo era avaliar se essa dieta tinha alguma utilização pratica na perda de peso ou na diminuição dos riscos para doenças cardiovasculares.

O estudo foi realizado com 428 pacientes do Grupo 0, 343 do grupo A, 154 do B e 48 do AB que foram acompanhados por 6 meses e comparados com outras dietas, como a DASH.

Todos os pacientes que aderiram à alimentação proposta evoluíram com perda de peso e diminuição de marcadores de doença cardiovascular como circunferência abdominal e índice de massa corporal, independentemente do tipo sanguíneo.

As 4 dietas propostas no tipo sanguíneo tem um alto consumo de frutas de vegetais e sugerem que alimentos processados sejam evitados, o que leva a perda de peso. O principal fator associado aos bons resultados na perda de peso foi conseguir aderir à alimentação proposta.

Este artigo conclui que as afirmações do livro sobre o grande benefício de se realizar uma dieta de acordo com o seu grupo sanguíneo não têm evidencia cientifica. Logo, é um mito!

O que não significa que você não pode seguir a dieta do grupo sanguíneo.  O mais importante é encontrar uma alimentação saudável que esteja de acordo com seus hábitos culturais e sociais, que permita evitar e até tratar algumas doenças, que esteja equilibrada com os seus gastos de calorias durante o dia. Para equalizar todas estas questões é fundamental buscar um profissional de saúde da confiança.

Bons treinos!

Sobre o autor

Guilherme Giorelli é nutrólogo e médico do esporte e exercício. Fellow do International College for Advancement of Nutrology e com mestrado em vitamina D, ele organiza eventos científicos, além de ministrar aulas e palestras. Atualmente é diretor do SMEERJ (Sociedade de Medicina Esportiva e do Exercicio do Rio de Janeiro). Seu dia a dia, porém, é o atendimento de pacientes em sua clínica, que buscam cuidar da saúde por meio da alimentação e do exercício.

Sobre o blog

Este blog é para discutir, sob a ótica da nutrologia e da medicina do esporte, qual o impacto da alimentação sobre o nosso organismo, quais as suas relações com o exercício e como a suplementação pode ajudar. Afinal, todo dia existem novos artigos sendo publicados, novas verdades para serem aprendidas ou questionadas. A ciência nunca está parada, nem você deve ficar.