O que os pais precisam saber para conviver com o adolescente
A cena cria frustração nos pais de adolescentes: eles chamam o filho para um lanche e o garoto prefere ir para outro canto. Festa na casa dos tios? O programa é imediatamente recusado e, se duvidar, com cara de desdém. Cinema? Nem isso. A sensação é que terminaram aqueles momentos com todos juntos. E essa é uma queixa que, às vezes, chega no meu consultório. Afinal, a hebiatria, área da Medicina que cuida do período da adolescência, engloba várias questões comportamentais.
Primeiro, gosto de lembrar o seguinte: nos tempos atuais, o que mudou bastante é a forma de comunicação. Nem preciso ir para os tempos do meu avô. Aliás, nem sequer para os meus próprios tempos de adolescência. Há cinco anos, a juventude não vivia com esse aparelhinho para cima e para baixo, o smartphone, que permite que a gente entre em contato com tudo e com todos o tempo inteiro. Esse mundo lá fora, ainda que virtual, já é por si uma concorrência enorme. E os pais precisam entender isso. Não dá para ir contra.
O adolescente atual já não conhece apenas o amigo da rua de cima e a menina da sala de aula. Ele pode passar horas trocando mensagens com quem nunca viu pela frente.
E, se parar para observar, há alguns anos os pais ainda se preocupavam com sistemas de segurança, que instalavam no computador para que o filho não tivesse acesso a determinados sites. Ou acionavam códigos na televisão para que o menino não visse certos filmes. Hoje em dia, isso não faz o menor sentido. Com o celular, a garotada acessa qualquer coisa.
E, assim, os adolescentes recebem cada vez mais e mais estímulos em uma fase em que eles já estão, por natureza, em franca mudança. Só que a enxurrada de informações também faz diferença no processo.
As neurociências mostram que, em algumas áreas cerebrais, os neurônios só firmam suas conexões lá pelos 24, 25 anos. Entre elas está o córtex frontal, na altura da testa.
Sabemos que essa região, entre outras coisas, é responsável por comportamentos que associamos à maturidade, como a capacidade de fazer uma previsão das consequências daquilo que fazemos.
O fato é que o córtex frontal em ebulição, diante de tantos estímulos diferentes, faz mesmo com que aquela "criança" — quero lembrar que a adolescência começa aos 10 anos — vá amadurecendo, criando novas conexões, e se distanciando. Outras coisas lhe chamam muito mais a atenção do que a casa da tia, por exemplo.
E existem ainda os amigos. Todo o processo de amadurecimento gera insegurança. E é normal que pessoas, em qualquer idade, vivendo uma mesma situação delicada se juntem para sentir uma proteção.
Nesse contexto, os pais devem ter a sensibilidade para descobrir o que chamo de momentos mágicos com o seu filho adolescente. Apesar desse apelido, ele pode ser uma simples ida até a padaria da esquina. Serão apenas dois quarteirões caminhando. Mas valorize cada passo desse trajeto, aproveite para conversar. Não há desculpa para aumentar o distanciamento e achar o programa pequeno: os adultos precisam cavar todas as oportunidades. Conheço um pai que arrumou um curso de marcenaria para fazer com o filho. Outros apelam para um esporte. Tudo vale. Desde que o jovem se interesse. E que não seja uma obrigação forçada para você, só para ficar com ele.
Ah, bom, tem outra coisa: muitas vezes, os adultos se queixam de que os adolescentes não falam, mal respondem. Garanto que eles falam. Mas, de novo, é uma questão de você aguçar a sua sensibilidade. Perceber o exato momento em que o jovem está apto a conversar. E também escolher o assunto que irá puxar naquele instante. Sim, porque outra caraterística da adolescência é a famosa flutuação de humor.
A menina chega da escola e não quer abrir a boca. Dez minutos depois, está dando gargalhadas. Em seguida, se tranca no quarto. Você vai lá e a vê aos prantos. Volta e ela está em um papo animado por telefone. Cá entre nós, se fosse uma pessoa adulta, você internava no hospital psiquiátrico. Mas, na adolescência, essas variações de humor são normais e, dentro de limites, devem ser permitidas.
Os pais, portanto, precisam perceber aquele momento em que podem ouvir uma resposta positiva, caso convidem o adolescente para algum passeio ou outro tipo de programa. E puxar assuntos de acordo com o clima.
Não adianta também insistir naquilo que pode ser bom ou importante para os adultos, mas nem sempre será tão bom e tão importante para o adolescente. Ninguém deve ficar ofendido com as recusas. Aliás, anormal seria um jovem de 16, 17, 19 anos que fosse sempre ao cinema com a família ou que preferisse ficar na sala de visitas com os avós em vez de sair com amigos.
O importante é insistir do jeito certo. Ouvir o "não" sem mágoas. E aproveitar cada vez que ouvir o "sim". Até porque os pais sempre são parâmetro para os adolescentes. Os filhos jovens podem imitá-los ou, no sentido completamente oposto, discordar 100 por cento. Mas, até para que discordem –e cresçam–, precisam ter a referência. Referência que só aparece com o conhecimento um do outro, proporcionado pela convivência.
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