Topo

Equilíbrio

Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


Não se sente suficiente? Sentimento é normal e pede reavaliação das crenças

iStock
Imagem: iStock

Simone Cunha

Colaboração para o UOL VivaBem

03/07/2019 04h00

Resumo da notícia

  • A pressão social tem forte correlação com os sentimentos de insuficiência, fracasso e imperfeição
  • É essencial se adequar às suas próprias habilidades e desejos para não se apegar a uma necessidade que não é real
  • A reestruturação de crenças centrais e a ressignificação dos sentimentos são essenciais para vencer o problema

Parece que falta algo? Essa sensação de insuficiência tem sido muito mais frequente, afinal sucesso, riqueza, fama, beleza e poder transformaram-se nos indicadores de felicidade e de uma vida com significado. Por isso, estamos sempre em busca de 'algo a mais'.
Portanto, a pressão social tem forte correlação com os sentimentos de insuficiência, fracasso e imperfeição. Mas é importante destacar que indivíduos com identidades mais bem formadas e com sólidas crenças sobre seu valor pessoal e capacidades tendem a se sentirem mais gratificados e realizados. Ao contrário daqueles com baixa autoestima que se tornam mais vulneráveis diante de toda essa cobrança social.

"Têm pessoas com dificuldade porque alimentam uma expectativa alta, mesmo sem habilidade para atingir alguns degraus, e cada um deve saber e respeitar os seus limites", aconselha Eliana Melcher Martins, diretora e coordenadora no Centro de Estudos em Terapia-Cognitivo Comportamental da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). É o caso da pessoa que escolhe uma profissão para agradar a família, por exemplo, e depois se cobrar para se dar bem no campo escolhido, mesmo sem vocação.

Crescimento pessoal em risco

O psicólogo Ricardo Wainer, psicoterapeuta cognitivo-comportamental e professor titular do curso de psicologia da PUCRS (Pontifícia Universidade Católica Rio Grande do Sul) explica que a autopercepção de insuficiência, defeito ou fracasso levam os indivíduos a alguns mecanismos para lidarem com os sentimentos negativos. Entre eles, a tendência de limitar suas metas e ambições (por não acreditar ser possível atingi-las), e a evitação de situações ou pessoas que possam ativar emoções aversivas quanto a sua competência.

"Há ainda a possibilidade (mais remota), do sujeito se colocar em desafios ousados demais (agindo opostamente às suas crenças), os quais tendem a gerar consequências negativas, como críticas, prejuízos ou fracassos", acrescenta psicólogo. E isso acaba reforçando os esquemas mentais de incapacidade ao final da situação.

Neste caso, é essencial se adequar às suas próprias habilidades e desejos, pois a falta de autoconhecimento provoca uma necessidade que não é real. Na prática, ninguém obriga ninguém a nada e, muitas vezes, a própria pessoa se força a realizar feitos para agradar a expectativa do outro. "É sempre importante romper com valores familiares, sociais e culturais. E se não conseguir sozinho, buscar ajuda profissional para encontrar seu verdadeiro caminho", fala Martins.

Sentimento pode estar ancorado na infância

Os mais importantes esquemas mentais (estruturas mentais que armazenam crenças, regras e memórias sobre determinados temas da vida) relacionados ao desenvolvimento da identidade pessoal se desenvolvem na infância até o início da adolescência. "Dentre as diversas etapas/desafios na formação da personalidade, temos a construção de esquemas relacionados à competência e autonomia", alerta Wainer. Assim sendo, pessoas que possuem crenças e sentimentos de insuficiência, fracasso, defeito ou dependência continuamente, podem ter tido experiências tóxicas em suas infâncias.

As experiências emocionais corretivas, em ambientes sociais, acadêmicos, profissionais ou pessoais costumam ajudar na mudança dos comportamentos derrotistas e de autossabotagem. No entanto, às vezes, é realmente necessário a psicoterapia para desenvolver a habilidade do indivíduo em se valorizar pelas conquistas e decisões atingidas.

Cobranças excessivas

Um alto grau de criticismo (nunca nada está suficientemente bom) e/ou punições contribuem muito para o desenvolvimento desse sentimento de insuficiência. Por isso, o papel dos cuidadores é de essencial importância, ao fornecer incentivo, reforço e liberdade para a criança e adolescente em relação à realização de tarefas. "Crenças e sentimentos negativos relacionados à insuficiência, defeito e fracasso costumam surgir nos ambientes da infância, por meio da família e do grupo de amigos. E o sujeito começa a criar 'explicações' para os estímulos aversivos das pessoas próximas", ressalta Wainer.

Comparações negativas

Para Martins, as comparações são terríveis, afinal cada um é único. E, principalmente, quem tem irmãos sabe que isso é quase inevitável. As comparações estão sempre presentes e, nem sempre, somos nós os bons exemplos.
Porém, é válido reforçar que comparações negativas ou injustas regulares estão mais presentes em ambientes críticos/punitivos geradores da sensação de insuficiência e imperfeição. "Tais comparações inadequadas se tornam as auto-afirmativas que o adulto faz a si mesmo nas mais diversas situações de performance ao longo de sua vida", diz Wainer.

Encare o problema!

A reestruturação de crenças centrais e a ressignificação dos sentimentos relacionados à antigas memórias dos indivíduos que sofrem das sensações de insuficiência, defectibilidade, fracasso e/ou dependência são essenciais para vencer o problema. Identificar isso já é um primeiro passo. Só assim, dá para sentir prazer e motivação para perseguir metas pessoais que, acabam sendo revistas, voltando-se mais para suas próprias tendências e interesses pessoais legítimos, do que para padrões externamente impostos.
Se a infelicidade parece constante, reflita! Antes que esse grau de insatisfação se transforme em uma depressão ou síndrome de Burnout. "É muito importante fazer uma reflexão para perceber qual vazio precisa ser preenchido", finaliza Martins.