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Mutação genética que causa câncer pode ter tratamento simples

De acordo com estudo recente, composto encontrado em legumes crucíferos é benéfico para pacientes - Todd Anderson/The New York Times
De acordo com estudo recente, composto encontrado em legumes crucíferos é benéfico para pacientes Imagem: Todd Anderson/The New York Times

Gina Kolata

Do New York Times

23/05/2019 11h11

Quando Kelley Oliver Douglass teve câncer de mama, um conselheiro genético lhe fez uma pergunta estranha: você e seus filhos têm problemas para encontrar chapéus que sirvam?

A resposta foi positiva, e isso deu ao conselheiro uma pista para a fonte do câncer: uma mutação em um gene chamado PTEN.

Além de aumentar a circunferência da cabeça, essa mutação rara aumenta acentuadamente o risco de vários cânceres, incluindo o de próstata e o de mama (o risco de vida em portadores é de 85 por cento), assim como autismo e esquizofrenia em alguns indivíduos.

Douglass, de 51 anos, de Monte Dora, na Flórida, e seus filhos apresentam uma mutação do PTEN. Agora, os pesquisadores encontraram uma maneira de combatê-la - e o tratamento pode estar bem à mão, na farmácia local.

Em um estudo publicado na quinta-feira na revista "Science", os pesquisadores encontraram evidências de que um composto chamado indol-3-carbinol (I3C) bloqueia uma enzima que inibe a atividade do PTEN. Com o gene mais ativo, os pacientes com a mutação podem estar mais bem protegidos contra o câncer.

Eles poderiam obter mais I3C simplesmente comendo couve-de-bruxelas, brócolis ou outros legumes crucíferos. Mas, para obter a quantidade suficiente, teriam de comer muito: seis quilos de couve-de-bruxelas por dia - e crua.

Porém o I3C também está disponível em um suplemento dietético e os especialistas estão pensando em iniciar um teste clínico com ele.

O novo estudo foi feito apenas em camundongos e em células cancerosas humanas cultivadas em placas de Petri. Os achados só se aplicam à atividade gênica do PTEN - há pouca evidência para a maioria das outras alegações sobre o I3C feitas por fabricantes de suplementos.

As mutações herdadas do PTEN são raras, atingindo uma pessoa em cada 200 mil. No entanto, se a pesquisa se sustentar, pode ser importante para um número maior de pacientes com câncer. A mutação não é apenas herdada; o gene PTEN sofre mutação espontânea em muitos tumores. Quando isso acontece, o prognóstico do paciente não é dos melhores.

A atividade do PTEN é prejudicada na grande maioria dos cânceres humanos. Uma droga que reativa o gene poderia ajudar a reduzir o crescimento do câncer.

O dr. Mustafa Sahin, especializado no gene PTEN no Hospital Infantil de Boston, chamou a nova pesquisa de "um grande feito". O resultado é "uma mudança de paradigma no campo e muito animadora no que se refere a suas implicações terapêuticas", escreveu em um e-mail Sahin, que não estava envolvido na pesquisa.

O dr. Pier Paolo Pandolfi, principal autor do estudo e diretor do centro de câncer do Centro Médico Beth Israel Deaconess, em Boston, passou anos tentando encontrar uma maneira de restaurar a atividade do PTEN.

O gene governa a produção de uma enzima que impede as células de se dividirem rapidamente, reduzindo as chances de que os cânceres se formem. Com a atividade reduzida do PTEN, as células crescem descontroladamente.

As mutações desse gene não interrompem completamente suas funções. Em vez disso, diminuem sua atividade, por isso as células produzem menos enzimas necessárias para o crescimento ordenado.

Mas uma das coisas mais difíceis para os pesquisadores é encontrar uma maneira de aumentar, em vez de desligar, a atividade de um gene. No fim, Pandolfi e seus colegas aprenderam o suficiente sobre o sistema PTEN para perceber que o I3C poderia funcionar.

"Tivemos sorte, ou fomos espertos", disse ele.

Pandolfi e seus colegas testaram o tratamento em células humanas de câncer de próstata e nas de camundongos criados para desenvolver essa doença. Funcionou: nas células e nos camundongos, o tratamento I3C resultou em menos cânceres, e aqueles que surgiram eram pequenos e menos mortais.

A descoberta, mesmo que intrigante, gera uma pergunta difícil para as pessoas com mutações do PTEN.

Elas devem correr para a farmácia e comprar I3C, esperando que possa diminuir o risco de câncer? Os pacientes com câncer que desenvolveram mutações do PTEN deveriam fazer o mesmo?

Ou todos devem esperar por testes clínicos rigorosos e por uma versão farmacêutica do I3C?

Pandolfi fez essas perguntas a vários grupos de defesa de pacientes. Todos concordaram que um ensaio clínico é necessário.

Mas alguns acreditam que é preciso esperar que uma empresa farmacêutica faça um composto mais potente. Alguns pacientes temem que, se o teste com um suplemento falhar, ninguém vai querer tentar novamente.

Outros querem ir adiante imediatamente com o teste, usando um composto I3C feito de tal maneira que sua pureza e potência estejam asseguradas.

Kristin Anthony, presidente e executiva-chefe da Fundação PTEN, tem a mutação no gene, assim como sua filha de 16 anos. Preocupada com o uso de um suplemento de farmácia e esperando por algo melhor, ela pede que os especialistas comecem um ensaio clínico agora com a forma pura de I3C.

Se os resultados forem promissores, ela espera que uma empresa farmacêutica possa desenvolver e testar uma forma mais potente.

Por sua vez, Douglass está fazendo tudo que pode para proteger a si mesma e a seus filhos do câncer. Ela removeu profilaticamente sua mama não afetada, além de também ter feito uma histerectomia profilática.

Uma tomografia computadorizada encontrou um câncer renal em estágio inicial, então parte de seu rim foi removida. Ela faz colonoscopias frequentes para verificar se há câncer de cólon e exames de pele em busca de melanomas.

Sua filha de 20 anos começará em breve a fazer mamografias, como é recomendado para jovens com mutações do PTEN.

"Um teste clínico poderia literalmente mudar a vida dos meus filhos", disse Douglass. "Eu certamente participaria de um ensaio clínico."

Enquanto isso, disse ela, "vou comer mais brócolis".

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