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Portadores de hanseníase são segregados no Brasil, diz relatora da ONU

Janeiro Roxo é o mês de conscientização sobre a hanseníase - Divulgação / Agência Brasil
Janeiro Roxo é o mês de conscientização sobre a hanseníase Imagem: Divulgação / Agência Brasil

Letycia Bond

Da Agência Brasil

15/05/2019 12h11

A relatora especial da Organização das Nações Unidas para a Eliminação da Discriminação contra Pessoas Afetadas pela Hanseníase, Alice Cruz, afirmou hoje (14), que, no Brasil, quem tem confirmado o diagnóstico da doença sofre uma segregação "institucionalizada e interpessoal". Segundo a especialista, ainda na atualidade, embora comunidades - mais frequentemente denominadas colônias - continuem funcionando em quase todos os estados do país, elas não operam dentro de um modelo capaz de mitigar a "indigência institucional" à qual estão submetidas as pessoas com a doença.

A representante da ONU visitou, entre os dias 7 e 14 de maio, diversos pontos do Rio de Janeiro e do Pará, como o Hospital Curupaiti, situado na zona oeste da capital fluminense, para levantar informações sobre os direitos das pessoas portadoras da hanseníase.

A emissária da ONU destacou que o Brasil é um dos poucos países que instituíram um marco legal antidiscriminatório e medidas de reparação a indivíduos com hanseníase. Ela avalia que, mesmo com iniciativas pioneiras e uma queda na taxa de incidência durante a última década, a doença permanece como uma "questão sumamente importante", devido à relação que tem com disparidades sociais e estruturais.

Relatora especial da ONU, Alice Cruz, fala sobre eliminação da discriminação contra pessoas afetadas pela hanseníase e seus familiares - José Cruz/Agência Brasil
"Encontrei uma situação administrativa muito complexa, porque as colônias estão enquadradas na atenção à saúde, mas, na verdade, são espaços de residência. Então, não basta ter uma estratégia de saúde, pois as pessoas precisam de água, de luz. Isso impele a repensar a administração desses espaços", disse.

Brasil

Alice Cruz ressaltou que o Brasil é um dos países que apresentam, em nível global, os maiores índices de hanseníase. De acordo com o Ministério da Saúde, o país se encontra entre os 22 no mundo que têm as mais elevadas cargas da doença.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 200 mil novos casos da doença são detectados em todo o mundo, a cada ano, sendo que Brasil, Índia e Indonésia concentram 80% desse total. Ainda segundo a entidade, o Brasil respondeu por 93% dos 29.101 casos detectados em 2017.

Outro dado apontado por Alice Cruz é que a doença se faz mais presente nas regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste, sobretudo na Amazônia Legal. O Maranhão, salientou a emissária, foi o estado em que se descobriu, em 2017, a maioria dos casos em crianças menores de 15 anos e que ficou em segundo lugar em números absolutos, com 11,59% do total de casos registrados no país.

Alice Cruz disse que durante seu trabalho de campo, foram relatadas situações que evidenciam o preconceito vivido por pacientes com hanseníase e também o aprofundamento da vulnerabilidade social e do estigma imposto a essas pessoas. Ela disse que crianças chegaram a ser expulsas da escola, depois que profissionais da instituição souberam que um dos pais tinha hanseníase.

"É muito mais do que a doença, ela afeta todas as dimensões da vida de uma pessoa", alertou.

A relatora informou que agora reúne suas observações em um relatório e que a previsão da divulgação do material é junho do ano que vem.

Hanseníase

A hanseníase é uma doença crônica e que tem como agente etiológico o bacilo Micobacterium leprae. A infecção por hanseníase pode acometer pessoas de ambos os sexos e de qualquer idade. Porém, como salientou Alice Cruz, tem difícil transmissão, já que é necessário um longo período de exposição à bactéria, motivo pelo qual apenas uma pequena parcela da população infectada chega a realmente adoecer.

A doença é transmitida pelas vias áreas superiores (tosse ou espirro), por meio do convívio próximo e prolongado com uma pessoa doente sem tratamento. A doença apresenta longo período de incubação, ou seja, há um intervalo, em média, de 2 a 7 anos, até que sintomas se manifestem. De acordo com o Ministério da Saúde, já houve, porém, casos atípicos, em que esse período foi mais curto - de 7 meses - ou mais longo - de 10 anos.

A hanseníase provoca alterações na pele e nos nervos periféricos, podendo ocasionar, em alguns casos, lesões neurais, o que gera níveis de incapacidade física. Os estados do Maranhão e do Pará são os que concentram mais quadros do grau 2 de incapacidade física, quando a análise se restringe a pacientes com até 15 anos de idade, enquanto o Tocantins tem a maior taxa entre a população geral, de todas as faixas etárias.