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A maconha comestível pode apresentar riscos à saúde

Andres Stapff/Reuters
Imagem: Andres Stapff/Reuters

Roni Caryn Rabin

Do New York Times

22/04/2019 04h00

Brownies e outros "comestíveis" de cannabis que são vendidos on-line em lugares dos Estados Unidos onde a maconha é legalizada podem parecer uma diversão inofensiva, mas uma nova pesquisa indica que a ingestão pode ser mais potente e potencialmente mais perigosa que fumar a erva ou vaporizá-la.

O novo estudo analisou milhares de visitas ao pronto-socorro causadas por cannabis na área metropolitana de Denver e constatou que os comestíveis induziram um número desproporcional de crises médicas relacionadas à maconha. Estes também tinham maior probabilidade de causar intoxicação severa, sintomas psiquiátricos agudos em pessoas sem histórico de doença psiquiátrica e problemas cardiovasculares.

Por outro lado, os fumantes da erva tinham maior probabilidade de se queixar de problemas gastrintestinais, incluindo o vômito causado pela chamada síndrome de hiperêmese de canabinoide, e tinham maior chance de hospitalização se necessitassem de cuidados de emergência.

Os médicos de prontos-socorros no Colorado começaram a notar há vários anos que "havia muitas visitas associadas aos comestíveis, embora não fossem o produto predominantemente usado, e os pacientes pareciam estar mais doentes em comparação com aqueles que fumavam", disse o dr. Andrew Monte, professor associado de medicina e principal autor do novo estudo, publicado em "Annals of Internal Medicine" em 26 de março.

Ele também observou que as únicas mortes no Colorado que foram definitivamente atribuídas à cannabis envolveram comestíveis e foram surpreendentemente violentas. Em todos os três incidentes, incluindo um assassinato e um suicídio em 2014 e outro suicídio em 2015, os usuários de maconha exibiram um comportamento extremamente errático após a ingestão de comestíveis, de acordo com notícias e depoimentos no julgamento.

A maconha ingerida leva mais tempo para dar barato que a fumada, o que dificulta medir a dose certa para atingir o efeito desejado, aumentando o risco de uma overdose, dizem os especialistas. A maconha ingerida também leva mais tempo para ser eliminada do corpo.

"Quando você fuma maconha, começa a ver os efeitos em alguns minutos", disse Nora D. Volkow, diretora do Instituto Nacional de Abuso de Drogas dos Institutos Nacionais de Saúde, que escreveu o editorial que acompanha o estudo. "Mas, quando você a consome por via oral, leva muito tempo para sentir os efeitos, e, se faz isso para se sentir bem e não sente nada, acaba achando que não comeu o suficiente. Esse é um fenômeno comum: as pessoas consomem outra dose."

Os doces "parecem inocentes e seguros, daí você come outro e outro, e a maconha está sendo absorvida. E então você começa a se sentir horrível, antes da absorção completa, e isso pode levar a um episódio psicótico", disse Volkow.

As respostas aos efeitos dos comestíveis e à taxa de absorção variam de pessoa para pessoa, e o índice de THC nos produtos não pode ser exatamente determinado, afirmou ela. A absorção de comestíveis também varia, dependendo do teor de gordura do alimento consumido, disse ela, observando que "o conteúdo em seu sangue vai ser muito maior se a maconha estiver no chocolate ou em um brownie, em vez de em uma bala de goma".

O novo estudo descobriu que, embora os comestíveis tenham representado menos de um terço de um por cento das vendas totais de cannabis no estado em peso de THC entre 2014 e 2016, eles eram responsáveis por 238 das 2.432 visitas causadas pela droga ao departamento de emergência do UCHealth da Universidade do Colorado, ou cerca de 10 por cento. Os autores calcularam que havia 309 vezes mais THC vendido em flor ou na forma para o fumo em comparação com produtos comestíveis durante o período examinado de três anos.

Os sintomas também tendem a variar, dependendo da maneira como a maconha foi consumida. Quase metade dos pacientes de pronto-socorro que consumiram comestíveis se queixou de intoxicação ou de estado mental alterado, muitas vezes acompanhado de ansiedade, em comparação com menos de um terço daqueles que haviam fumado.

Cerca de um quarto dos que fumaram e dos que comeram experimentou problemas psiquiátricos, mas estes últimos eram mais propensos a apresentar sintomas psiquiátricos agudos, enquanto os primeiros tinham maior probabilidade de reclamar da exacerbação de uma condição crônica, como a depressão.

Além disso, oito por cento dos usuários de comestíveis apresentavam sintomas cardiovasculares, incluindo frequência cardíaca rápida ou irregular, em comparação com apenas três por cento dos que fumaram. Eventos cardiovasculares graves, incluindo ataques cardíacos, ocorreram em ambos os grupos. Outros estudos também relataram a nova preocupação com problemas cardiovasculares que estão sendo associados ao uso da maconha, disse Volkow.

As preocupações com os comestíveis não são novas, e muitos estados que legalizaram o uso recreativo ou médico, incluindo Colorado, Califórnia, Rhode Island, Nevada e Oregon, exigem que as embalagens dos comestíveis avisem que os efeitos intoxicantes não podem ser sentidos imediatamente, disse Camille Gourdet, pesquisadora que estuda políticas estaduais de cannabis na RTI International, uma organização de pesquisa sem fins lucrativos.

Muitos estados também exigem que os comestíveis sejam claramente marcados com um símbolo que adverte os consumidores de que os produtos contêm cannabis e que não são itens alimentares regulares, disse Gourdet. Diversos estados também exigem que os comestíveis tenham a mesma distribuição do índice de THC por todo o produto, evitando assim a concentração em uma única mordida de um cookie ou de um brownie.

Monte, que faz parte do Comitê Consultivo de Saúde Pública sobre a Venda de Maconha do Colorado, disse que não acha que os comestíveis deveriam estar disponíveis nas lojas. Ele afirmou que o importante para os consumidores é que há mais efeitos adversos associados a produtos comestíveis que aos outros, e que os primeiros são mais propensos a desencadear problemas psiquiátricos. Quem usa pela primeira vez - um grupo que, no Colorado, muitas vezes inclui turistas - corre um risco maior, disse ele.

"Se vão comer um desses produtos, devem consumir uma dose mais baixa, entre 5 e 10 miligramas. Consuma e não repita a dose antes de quatro horas, porque pode levar algum tempo."

Na semana passada, sociedades médicas estaduais de Nova York, Nova Jersey, Connecticut e Delaware divulgaram uma declaração conjunta dizendo que, embora apoiem a mudança do estatuto jurídico da droga para facilitar a pesquisa, eles se opõem à legalização da maconha recreativa, porque não há pesquisa suficiente provando que seja segura.

"Devemos olhar para o efeito potencial que a legalização terá sobre o uso global e os danos significativos, incluindo dificuldades para dirigir e propensão a acidentes, criação e agravamento de problemas graves de saúde mental e impactos negativos sobre o desenvolvimento mental", disse a declaração. "Os estados que têm pressa em legalizar a maconha recreativa estão ignorando como as corporações que visam ao lucro viciaram gerações de americanos em cigarros e opioides, matando milhões e afetando os recursos públicos."