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Menopausa também pode ter efeitos na memória; saiba como reverter

60% das mulheres apresentam déficit cognitivo relacionado à menopausa - Gracia Lam/The New York Times
60% das mulheres apresentam déficit cognitivo relacionado à menopausa Imagem: Gracia Lam/The New York Times

Jane E. Brody

Do New York Times

26/12/2018 09h26

A paciente de Gayatri Devi, uma ex-diretora de escola de 55 anos, tinha boas razões para estar preocupada. Após um ano enfrentando perdas de memória progressivas e problemas comportamentais, foi levada à neurologista com um possível diagnóstico de demência frontotemporal.

Segundo relatado por Devi na publicação científica Obstetrics & Gynecology, a memória da paciente, antes prodigiosa, foi severamente danificada e ela se mostrava cada vez mais irritada. Para ela era difícil organizar as tarefas, encontrar pertences, estabelecer objetivos, fazer e cumprir planos. Mesmo assim, os resultados dos testes médicos e neurológicos e das tomografias do cérebro estavam normais.

Ao perceber que a paciente tinha passado pela menopausa um ano antes, Devi relacionou os sintomas ao declínio do estímulo de estrogênio no cérebro que acomete todas as mulheres na menopausa, porém com efeitos diversos, algumas são mais sensíveis à queda de estrogênio do que outras.

Tendo em mãos um provável diagnóstico de déficit cognitivo relacionado à menopausa, a médico prescreveu uma terapia de reposição hormonal. Em 15 meses, os sintomas comportamentais desapareceram e sua habilidade de aprendizado e memória estavam normais. Ela foi capaz de concluir um programa de pós-graduação exigente e assumir uma nova posição de liderança na área da educação.

Não há dúvidas de que o caso dessa mulher foi extremo, mas Devi me contou que "60% das mulheres apresentam déficit cognitivo relacionado à menopausa". Mas quando são sérios o bastante para chamar atenção dos médicos, muito frequentemente, são erroneamente diagnosticados como déficit cognitivo leve, um percursor da demência.

Os sintomas cognitivos ligados à menopausa são muito parecidos com o "nevoeiro quimioterápico", uma reclamação comum entre mulheres que receberam tratamento para câncer de mama e entre alguns homens submetidos ao tratamento contra câncer de próstata. A terapia de ambas as doenças normalmente resulta em uma queda abrupta dos níveis de estrogênio.

De acordo com explicação dada por Devi, neurologista no Hospital Lenox Hill em Nova York e professora clínica de neurologia no Centro Médico SUNY Downstate no Brooklyn, as pessoas que sofrem do nevoeiro cerebral após serem tratadas contra o câncer "têm problemas com memória de curto prazo, lidar com muitas tarefas ao mesmo tempo, encontrar palavras e elaborar pensamentos convincentes. O déficit cognitivo relacionado à menopausa acomete mulheres entre 40 e 50 anos, pessoas na flor da idade que, de repente, ficam sem chão".

Ela acredita que, apesar de comum, erra-se mais do que se acerta o diagnóstico. "Mulheres com déficit cognitivo relacionado à menopausa têm medo de estarem desenvolvendo alguma forma de demência, mas se elas consultarem um especialista em transtornos da memória talvez não recebam o diagnóstico correto", esclareceu Devi em uma entrevista, complementando que um clínico geral provavelmente investigará se existe uma doença na tireoide, uma deficiência vitamínica ou infecção, mas raramente irá relacionar o histórico menstrual da mulher com os sintomas cognitivos que apresenta.

Devi optou por publicar seu estudo no periódico de obstetrícia porque, para muitas mulheres de meia-idade, o ginecologista é o médico de atendimento primário, "e eu quero que eles saibam da existência dessa condição e que ela normalmente pode ser resolvida com um tratamento de estrogênio de curto prazo que devolve ao cérebro seu funcionamento normal".

Em um editorial que acompanha a publicação, Pauline M. Maki, professora de psiquiatria e psicologia da Universidade de Illinois em Chicago, observou que "além de as mulheres frequentemente relatarem dificuldade cognitivas à medida que passam da pré-menopausa à perimenopausa à pós-menopausa, elas têm performance inferior em testes neuropsicológicos padronizados que avaliam memória verbal, aspectos da função executiva e velocidade de processamento da informação".

As mulheres costumam descrever esses déficits como "nevoeiro cerebral". Tanto elas quanto seus médicos tendem a culpar a falta de sono associada às ondas de calor e aos suores noturnos, que definitivamente sobrecarregam o cérebro, como explicou Maki. Contudo, ela lembrou que, apesar de esses sintomas comuns da menopausa contribuírem para a gravidade dos problemas de memória, eles não são a causa primária das disfunções cognitivas enfrentadas por essas mulheres.

Um estudo que analisou 1.903 mulheres de meia-idade por um período de seis anos concluiu que sintomas relacionados à menopausa, como depressão, ansiedade, distúrbios do sono e ondas de calor não causavam um piora da memória, do aprendizado e da velocidade em que o cérebro processa informações durante a transição da menopausa.

"A coisa mais útil que podemos fazer é normalizar essas experiências para as mulheres que estão passando pelas fases da menopausa, esclarecendo que os cérebros delas são sensíveis à flutuação dos níveis de estrogênio tanto em termos de habilidade cognitiva quanto de temperamento", afirmou Maki.

Na verdade, sintomas bastante similares àqueles sentidos pelas mulheres na menopausa afetam muitas outras no período pré-menstrual, quando ocorre uma breve queda no nível de estrogênio. Mas, diferentemente de um ciclo de menstruação normal, o processo da menopausa é gradual e leva tipicamente meses, ou às vezes anos, o que torna mais difícil a relação entre ele e os problemas cognitivos.

O início do declínio dos níveis de estrogênio costuma acontecer por volta dos 45 anos, mas uma mulher pode atingir a fase da pós-menopausa apenas aos 50, ou ainda mais tarde, período em que o sangramento menstrual cessa por pelo menos um ano e pouquíssimo estrogênio é liberado pelos ovários.

Outro fato de suma importância que toda mulher passando pela menopausa deveria saber é que os efeitos sobre o cérebro e o humor são passageiros, alertou Dr. Gail A. Greendale, especialista em geriatria e saúde da mulher da Escola de Medicina David Geffene da Universidade da Califórnia, Los Angeles. Aparentemente, o cérbero pós-menopausa se adapta aos níveis baixos, ou inexistentes, de estrogênio.

Em uma pesquisa liderada por Greendale, 2.362 mulheres foram acompanhadas por quatro anos. A deterioração da memória e da habilidade de aprendizado característica do processo da menopausa foi revertida na pós-menopausa o que, segundo concluíram ela e suas colegas, "sugere que as dificuldades cognitivas relacionadas às mudanças da menopausa podem ser limitadas pelo tempo".

"O nevoeiro cerebral, quando o cérebro das mulheres parece não estar a pleno vapor, é temporário. Durante as transições da menopausa, a mulher pode sentir que está um pouco fora do ar, um pouco confusa, mas quando essa fase acaba, as nuvens se abrem e a neblina vai embora. Às vezes, tudo o que a mulher precisa saber é que isso também vai passar", expôs Greendale em uma entrevista.

Entretanto, para mulheres que não têm disposição ou não conseguem lidar com a transição, Maki aconselha algumas opções de tratamento além da reposição hormonal, como seguir a dieta mediterrânea, fazer caminhas rápidas e reduzir o consumo de álcool.

Para quem é seguro tomar estrogênio, é relevante notar que as participantes do Women's Health Initiative (Assistência Integral à Saúde da Mulher), um abrangente estudo liderado pelo governo americano sobre mulheres na pós-menopausa, que aleatoriamente foram escolhidas para começar a reposição hormonal aos 50 anos apresentaram taxa de mortalidade menor e menos possibilidade de morrer da doença de Alzheimer durante os 18 anos de acompanhamento.

Em 2015, a Sociedade Norte-americana de Menopausa apresentou uma revisão dos tratamentos livres de hormônio para ondas de calor, muitos dos quais também são capazes de aliviar os sintomas cognitivos. Um deles é a administração de uma dose baixa de cloridrato de paroxetina (Paxil), o outro, a gabapentina, um anticonvulsionante e analgésico que se liga aos receptores de estrogênio no cérebro.

A crítica de Maki é que os distúrbios cognitivos relacionados à menopausa "não precisariam comprometer a qualidade de vida da mulher", mas as mulheres talvez precisem ser proativas para assegurar que a condição seja corretamente diagnosticada e tratada.