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Cãibra do escrivão: "A mão travou e nunca mais consegui escrever direito"

Bruno Salgueiro tem cãibra do escrivão e não consegue escrever muito além do próprio nome - Arquivo pessoal
Bruno Salgueiro tem cãibra do escrivão e não consegue escrever muito além do próprio nome Imagem: Arquivo pessoal

Diego Garcia

Colaboração para o VivaBem

19/08/2018 04h00

Foi no final do ensino médio, aos 16 anos, que o engenheiro de software Bruno Salgueiro começou a sentir desconfortos no braço direito. “Estudava no período da manhã, cursava o ensino técnico à tarde e à noite ia para o cursinho. Por causa do vestibular, vivia ansioso e estudava insanamente", lembra.

Após meses nesse estresse mental, surgiram os primeiros sintomas. "Não conseguia mais segurar a caneta. Começava a escrever e logo tinha que parar. A mão não obedecia”. Logo depois veio o diagnóstico: cãibra do escrivão.

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Mente manda, corpo não obedece 

Após o início dos incômodos, demorou pouco tempo até Bruno não conseguir de fato escrever. “Minha mão funcionava normalmente para tudo, mas, para qualquer coisa relacionada com a tarefa da escrita, incomodava. Tinha vezes que eu forçava tanto que começa a levantar o braço para conseguir segurar a caneta e realizar o movimento. É como se a mão tentasse escapar. A mente manda, mas a mão não obedece. É essa sensação”, conta.

Segundo Rodrigo Meirelles Massaud, neurologista da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein, na cãibra do escrivão o paciente só tem o movimento distônico, a postura de torção da mão, do punho e do membro superior, quando ele escreve, por isso o nome da doença

O especialista explica que a dor por ocorrer, mas não é uma condição obrigatória do problema. “O nome cãibra é até muitas vezes questionável pela comunidade médica, pois traz a ideia de que é sempre algo doloroso, mas às vezes não é.” A distonia geralmente acomete os dedos, a mão e o punho, mas pode atingir o braço e até o ombro.

No caso do Bruno, apenas a tarefa de escrever é comprometida. Como ele trabalha com informática, diz que utiliza a escrita raramente e que consegue viver como se a doença não existisse. Mas algumas pessoas têm dificuldade para digitar e até para usar talheres, além de sentir cãibras ao insistir no movimento.

Hoje, dependendo da forma como segura a caneta, Bruno consegue assinar o nome. Mas tem certa dificuldade até para isso. 

O que causa o problema?

Rodrigo Meirelles Massaud, neurologista da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein, explica que a cãibra do escrivão pertence a um grupo de patologias chamado de distonias. São distúrbios do movimento caracterizados por contrações musculares que geram movimentos e posturas anormais, geralmente de torção. "No caso da cãibra do escrivão é uma distonia focal de tarefa específica”, diz Massaud.

É comum associar o problema a um transtorno psicológico ou psiquiátrico --e durante muito tempo ele até apareceu na classificação de doenças da Organização Mundial da Saúde sendo assim, o que é incorreto. 

"Quando se descobriu a doença, alguns achavam que se tratava de um distúrbio psicológico, uma histeria, devido a um trauma, a um estresse ou a algum outro fator. Não é uma doença psiquiátrica e nem um transtorno psicológico, é uma doença totalmente neurológica”, afirma Divanicio Pessoa, psicólogo e psicoterapeuta. Ele é coordenador do Centro de Atenção Psicossocial e descobriu que tinha cãibra do escrivão em 2002. Desde então, tornou-se pesquisador da doença no Brasil e no exterior.

Há relação com o estresse?

Ainda não foi confirmado cientificamente que o estresse tem um papel no processo de desencadeamento da cãibra do escrivão. " O que acontece tende a acontecer é que muitos pacientes sofrem um estresse muito grande antes de descobrir o problema, por ter uma letra horrível, por exemplo. Mas não dá para relacionar causa e efeito. E até esse diagnóstico muitas vezes levam anos”, esclarece Pessoa.

Massaud explica que não se sabe o que gera a doença. Não existe lesão no sistema nervoso central, mas, por meio de imagens do cérebro usadas por pesquisadores, é possível perceber alteração em algumas áreas, assim como em neurotransmissores como a dopamina e a acetilcolina, que podem ter um papel na distonia.

Existem várias possibilidades da origem do problema e cada paciente tem uma história. "No meu caso há a hipótese de que a condição surgiu devido a complicações no parto. Nasci cianótico [quando o bebê nasce com a pele roxa por falta de oxigênio] e isso afetou a área motora [do cérebro] e a área da psicomotricidade fina [cognição]”, relata Pessoa.

Como tratar

Não existe cura para a cãibra do escrivão, mas alguns tratamentos ajudam o paciente a conviver melhor com a doença. “Existe o tratamento com toxina botulínica, por exemplo, em que a pessoa deve realizar algumas aplicações. Os resultados demoram entre três e quatro meses para aparecer."  

No caso de Divanicio Pessoa esse tipo de tratamento não funcionou, e ele buscou métodos alternativos, que ainda não têm resultado comprovado pela ciência. 

“Para escrever é necessário uma certa agilidade e maestria. A toxina botulínica só relaxa o músculo, a escrita fica lenta, não flui. Por isso não resolveu para mim. Fiz algumas terapias alternativas e a que mais me ajudou foi a acupuntura. Pratico ioga e tai chi chuan há um tempo e isso acabou me ajudando também”, finaliza. 

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