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Estudo da USP descobre como álcool em dose moderada protege o coração

Vinho - iStock
Vinho Imagem: iStock

Do VivaBem*, em São Paulo

23/05/2018 13h33

Há pelo menos 20 anos diversos estudos têm mostrado que o consumo moderado de bebida alcoólica causa efeito cardioprotetor em grande parte das pessoas, mas ainda não se sabia ao certo o motivo. Agora, uma pesquisa conduzida no Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) indica que essa proteção pode estar relacionada com a ativação de uma enzima mitocondrial chamada ALDH2 (aldeído desidrogenase-2).

Ela ajuda a eliminar do organismo tanto os subprodutos tóxicos gerados pelo metabolismo do álcool como também um tipo de molécula reativa produzido nas células cardíacas quando estas sofrem um dano importante --como o causado pelo infarto.

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Julio Cesar Batista Ferreira, professor do Departamento de Anatomia do ICB-USP e coordenador da pesquisa apoiada pela FAPESP, explicou que os dados sugerem que a exposição moderada ao etanol causa um pequeno estresse nas células do coração, não suficiente para matá-las.

"Como consequência, ocorre uma reorganização no sinal intracelular e a célula cardíaca acaba criando uma memória bioquímica contra estresse, também chamada de precondicionamento. Quando a célula é submetida a um estresse maior, já sabe como lidar", disse à Agência FAPESP.

O trabalho vem sendo feito em parceria com cientistas da Universidade Stanford, nos Estados Unidos. Resultados recentes, obtidos durante o pós-doutorado de Cintia  Bagne  Ueta, foram publicados na revista Cardiovascular Research.

Infarto simulado

Para estudar os efeitos cardioprotetores do álcool em nível celular, os pesquisadores simularam uma condição semelhante ao infarto em corações de camundongos mantidos vivos em um sistema artificial. Nesse modelo, chamado "ex vivo", o órgão permanece batendo fora do corpo durante várias horas, sendo alimentado por uma solução rica em nutrientes e oxigênio.

Os cientistas então simulam uma condição clínica conhecida como isquemia e reperfusão, interrompendo o fluxo nutritivo para o coração durante 30 minutos. Quando a solução nutritiva volta a correr, o órgão recomeça a bater lentamente e, após uma hora, os pesquisadores conseguem avaliar o tamanho do dano. Em média, nesse modelo, cerca de 50% das células cardíacas morrem caso não seja feito nenhum tipo de intervenção.

Ferreira explicou que, antes, acreditava-se que o dano principal era consequência do período sem oxigênio. Estudos mostraram, porém, que durante a isquemia as células mudam seu metabolismo e entram em uma espécie de estado dormente.

"Quando a artéria é desobstruída, o tecido recebe uma enxurrada de sangue com nutrientes e oxigênio, e acaba ocorrendo um colapso metabólico nas células", ressaltou.

Em resposta ao estresse, as células cardíacas começam a produzir grandes quantidades de uma molécula reativa conhecida como 4-HNE (4-hydroxy-2-nonenal), pertencente à classe química dos aldeídos. Em excesso, essa substância tóxica começa a destruir estruturas celulares essenciais.

A enzima mitocondrial ALDH2 é a principal responsável por livrar o organismo dos aldeídos acumulados –tanto o 4-HNE das células cardíacas em estresse quanto o acetaldeído resultante da quebra da molécula de etanol no fígado após uma noite de bebedeira.

DNA também conta

Na avaliação de Ferreira, é possível fazer um paralelo entre o consumo regular de pequenas quantidades de álcool por seres humanos e os resultados observados nos corações de camundongos tratados em laboratório com etanol.

Mas tudo depende do que a pessoa carrega no DNA. "O acetaldeído resultante do metabolismo do etanol pode ser protetor em pequenas quantidades para a maioria da população, mas também pode maximizar o dano do infarto em um indivíduo com a mutação no gene da ALDH2. Essas pessoas são fáceis de serem identificadas, pois com apenas um copo de cerveja ficam com o rosto vermelho, dor de cabeça e não ganham resistência ao álcool com o tempo", disse.

O dano ao coração também pode ser agravado caso o álcool seja ingerido em quantidades elevadas, alertou Ferreira, pois isso resulta na produção excessiva de acetaldeído e torna o trabalho de limpeza promovido pela ALDH2 ainda mais difícil.

“O grupo tratado com a droga inibidora da ALDH2 [no qual o índice de morte celular chegou a 80%] mimetiza o que aconteceria em um caso de consumo excessivo de álcool. O difícil é estabelecer a dose segura para cada indivíduo, pois há muitas variáveis que afetam o metabolismo”, disse o pesquisador.

O grupo do ICB-USP tenta agora entender como a presença do acetaldeído resultante do metabolismo do álcool na célula cardíaca cria a memória que mantém a ALDH2 mais ativa. A ideia seria desenvolver uma droga capaz de mimetizar o efeito benéfico do etanol sem expor os indivíduos a riscos – entre eles o desenvolvimento de dependência química. (*Com Agência FAPESP)

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