Topo

Saúde

Sintomas, prevenção e tratamentos para uma vida melhor


Os 3 problemas-chave que a medicina teve de superar para melhorar cirurgias

O médico militar francês do século 16 Ambroise Pare é considerado por muitos o pai da cirurgia moderna - Getty Images
O médico militar francês do século 16 Ambroise Pare é considerado por muitos o pai da cirurgia moderna Imagem: Getty Images

16/05/2019 16h41

A cirurgia é uma das práticas médicas mais antigas de que se tem conhecimento. De fato, foram encontrados indícios de operações realizadas até 6.500 anos antes de Cristo.

Mas durante séculos esses procedimentos foram atos grosseiros e desesperados, frequentemente realizados de maneira desastrosa.

Longe de salvar vidas, durante muito tempo as cirurgias causaram uma enorme taxa de mortalidade e grande sofrimento.

Nos primórdios, a cirurgia era um último recurso, algo a ser feito apenas quando já não havia alternativa para salvar os pacientes.

Alguns dos "especialistas" que realizavam esses procedimentos nem eram médicos. Por volta do ano de 1500, os cirurgiões eram geralmente barbeiros.

Apenas no final do século 19, operações mais semelhantes às que conhecemos hoje começaram a ser realizadas. Algumas fontes médicas afirmam que apenas a partir do século 20 as chances de morrer após uma cirurgia passaram a ser menores que as de sobreviver.

Atualmente, as cirurgias são realizadas com técnicas minimamente invasivas, o que reduziu os tempos de recuperação e melhorou muito as taxas de sobrevivência.

Mas para chegar a essas cirurgias seguras e eficazes foi necessário superar vários desafios. Aqui, contamos quais foram os três principais problemas e como eles foram resolvidos.

Parar o sangramento foi o primeiro grande desafio dos cirurgiões para reduzir o número de mortes em operações - Getty Images - Getty Images
Parar o sangramento foi o primeiro grande desafio dos cirurgiões para reduzir o número de mortes em operações
Imagem: Getty Images

1 - Como parar a perda de sangue

Por muito tempo, sangrar até morrer foi um dos principais riscos de se submeter a uma cirurgia.

Parar a perda de sangue durante uma cirurgia é fundamental: se o corpo humano perde mais de 20% de seu sangue pode sofrer um choque hemorrágico, que é quando o coração diminui a velocidade dos batimentos e passa a circular uma quantidade insuficiente de sangue pelo corpo.

Quando isso acontece, a pressão arterial cai e há uma queda significativa na temperatura corporal.

Se o corpo perder mais de 40% de seu sangue, todos os órgãos começam a se fechar e a pessoa provavelmente morrerá.

Os primeiros que encararam o problema da perda de sangue foram os cirurgiões militares, já que um dos seus principais desafios era evitar o sangramento de feridas durante a guerra.

Inicialmente, eles apelaram para métodos antigos, como a ligadura - fechamento permanente de um vaso sanguíneo por meio de sutura -, originalmente praticada pelos médicos da Grécia Antiga.

O torniquete foi desenvolvido no século 16 para tratar amputações.

A cauterização, usando uma ferramenta metálica aquecida no fogo para fechar a ferida, também foi utilizada.

Mas nenhuma dessas técnicas funcionaria caso já tivesse havido uma perda significativa de sangue.

O que realmente resolveu o problema foi a transfusão de sangue, que só foi possível depois que Karl Landsteiner descobriu, em 1901, que os grupos sanguíneos devem ser compatíveis para que o sangue possa ser compartilhado.

O austríaco ganhou o Prêmio Nobel de Medicina em 1930 por essa descoberta.

A técnica de transfusão de sangue levou tempo até ser aperfeiçoada e não começou a ser usada extensivamente até depois da Segunda Guerra Mundial.

Durante muito tempo, as cirurgias causaram uma enorme taxa de mortalidade e grande sofrimento, ao invés de salvar vidas - Getty Images - Getty Images
Durante muito tempo, as cirurgias causaram uma enorme taxa de mortalidade e grande sofrimento, ao invés de salvar vidas
Imagem: Getty Images

2 - Como evitar a dor

Muitos não sabem que a anestesia não foi utilizada para realizar cirurgias até meados do século 19.

Até então, os pacientes tinham de suportar o sofrimento. Muitos deles ficavam em choque devido à extrema dor, o que forçava os cirurgiões a agir o mais rapidamente possível para encurtar o período de "tortura".

Durante séculos, procurou-se aliviar essa dor, testando uma série de substâncias sedativas, como álcool, plantas medicinais (muitas delas venenosas) e algumas drogas.

No século 10, o médico persa Avicena recomendou que os sedativos fossem inalados para agir mais rapidamente, um método que foi usado até o século 19.

O primeiro uso documentado de anestesia geral ocorreu no Japão em 1804, quando o médico Seishu Hanao usou uma poção feita a partir de plantas poderosas para adormecer sua paciente: uma mulher de 60 anos com câncer de mama que realizou uma mastectomia.

Finalmente, foi descoberto que alguns gases agiam como anestésicos eficazes.

Um dos primeiros a apontar isso foi o médico britânico Humphrey Davy, que descobriu em 1798 que o gás de óxido nitroso, mais conhecido como gás hilariante, aliviava a dor. Mas a comunidade científica não deu importância.

Henry Hill Hickman testou o dióxido de carbono como anestésico na década de 1820, mas sua descoberta também foi desmerecida.

Ironicamente, tanto o dióxido de carbono quanto o óxido nitroso são usados até ??hoje como anestésicos.

O primeiro anestésico geral usado para cirurgias foi o éter dietílico, identificado por Michael Faraday em 1818. Mas ele começou a ser utilizado décadas depois de sua descoberta - já que no começo, assim como o óxido nitroso, foi apenas usado como diversão por causa de seus efeitos alucinógenos.

No Reino Unido, os cirurgiões começaram a usar outra substância, o clorofórmio, que consideravam mais fácil de administrar, embora fosse mais arriscado. Juntamente com o éter, eles tornaram a anestesia uma prática comum no final do século 19, fazendo com que as cirurgias não fossem mais uma tortura.

Louis Pasteur foi o primeiro a reconhecer a existência de germes e Joseph Lister criou um sistema para combatê-los durante uma operação - Getty Images - Getty Images
Louis Pasteur foi o primeiro a reconhecer a existência de germes e Joseph Lister criou um sistema para combatê-los durante uma operação
Imagem: Getty Images

3 - Como prevenir infecções

Mesmo quando as cirurgias deixaram de doer, isso não melhorou as chances de sobrevivência.

Até mesmo os menores procedimentos poderiam ser fatais se a ferida fosse infectada.

No século 19, muitos pacientes que haviam sido operados com sucesso morreram após a cirurgia devido a doenças infecciosas, como sepse ou gangrena.

Os cirurgiões - uma especialidade profissional que acabara de ser criada - não conseguiam entender como aquelas infecções ocorriam ou se espalhavam.

Mas tudo mudou graças a um jovem médico britânico chamado Joseph Lister, que começou a estudar medicina em 1844, logo após a introdução dos anestésicos.

Lister tinha estudado a teoria do francês Louis Pasteur, que propunha que as doenças infecciosas eram causadas pela disseminação de microrganismos que ele chamava de germes.

O britânico decidiu aplicar esta chamada "teoria dos germes" ao problema das infecções pós-operatórias.

Ele desenvolveu um sistema para impedir que os germes entrassem na ferida, criando uma barreira química - que ele chamou de antisséptico - entre a ferida e o lado de fora.

Para isso, ele usou ácido carbólico, que matava os germes.

Ele também desenvolveu um protocolo cirúrgico rigoroso para reduzir as chances de infecção, lavando os instrumentos com ácido carbólico e criando um sabonete com base neste ácido para a equipe que realizaria a cirurgia.

Ele até criou um spray antisséptico para pulverizar ao redor do paciente e reduzir o nível de germes no ar.

Seus métodos reduziram drasticamente as mortes por infecção na sala de cirurgia.

No final do século 19, outros métodos foram criados para combater germes, como a esterilização a vapor ou com o calor seco, desenvolvido pelo cientista alemão Robert Koch. Assim, ambientes estéreis foram criados para serem capazes de receber uma cirurgia.

Finalmente, a descoberta dos antibióticos na década de 1940 deu aos médicos uma nova arma para combater infecções e fez das cirurgias os procedimentos seguros e eficazes que conhecemos hoje.