Topo

Equilíbrio

Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


Por que roubamos material do escritório?

Prejuízos econômicos causados por "pequenos furtos" são avaliados em centenas de bilhões de dólares anualmente - BBC
Prejuízos econômicos causados por 'pequenos furtos' são avaliados em centenas de bilhões de dólares anualmente Imagem: BBC

Yannick Griep*

31/01/2019 09h50

Prejuízos econômicos causados por 'pequenos furtos' são avaliados em centenas de bilhões de dólares anualmente; mas se esse comportamento é tão prejudicial, por que não o abandonamos de vez?

Você já levou material do escritório para casa? Roubou algumas canetas e papéis da sua empresa para os seus filhos? Ou até mesmo usou a impressora para imprimir ingressos para shows?

Em uma recente pesquisa anônima da empresa americana Papermate como parte do lançamento de uma nova caneta, todos os participantes admitiram ter roubado uma caneta do trabalho. Outros estudos indicaram que até 75% dos funcionários afirmaram ter surrupiado material do escritório no ano passado.

Os prejuízos em termos econômicos causados por esses "pequenos furtos" são avaliados em centenas de bilhões de dólares anualmente. Eles equivaleriam a até 35% da redução do inventário de uma empresa todos os anos ou uma média de 1,4% de suas receitas totais.

Então, se esse comportamento é tão prejudicial, por que não o abandonamos de vez?

Quando você começa em um novo emprego, seu empregador costuma fazer uma série de promessas em relação ao trabalho que não são necessariamente parte do seu contrato escrito.

Imagine que seu empregador prometeu a você "horário de trabalho flexível" e um "ambiente de trabalho harmonioso".

Ao fazer essas promessas, ele criou em você um conjunto de expectativas. Essas expectativas formam a base do que chamamos de "contrato psicológico".

Enquanto seu empregador mantiver sua palavra, você será um empregado feliz, comprometido e leal. O problema é que isso raramente acontece. Sabemos que, com o tempo, as percepções de empregadores e funcionários sobre o que foi prometido podem começar a se afastar da realidade.

Quando promessas são quebradas por empregador, você sente que pode pegar o que é 'legitimamente' seu - BBC - BBC
Quando promessas são quebradas por empregador, você sente que pode pegar o que é 'legitimamente' seu
Imagem: BBC

Promessas quebradas

Na realidade, muitas pessoas vão perceber, depois de um determinado tempo, que seu empregador vai deixar de cumprir suas promessas iniciais. Na verdade, cerca de 55% dos funcionários relatam que seu chefe quebrou as promessas nos primeiros dois anos de emprego e 65% dizem ter tido uma promessa quebrada no último ano.

Mais recentemente, estudos revelaram que os empregados têm que lidar com promessas quebradas a uma taxa semanal ou até diária.

Neste ponto, você provavelmente está pensando: "Então, se meu empregador quebra suas promessas tantas vezes, deve pelo menos se desculpar por elas, certo?" Infelizmente, uma série de estudos recentes indicou que os empregadores quase nunca percebem que fizeram alguma coisa errada.

Na verdade, eles só tentam justificar ou corrigir suas ações em cerca de 6% a 37% do tempo. Parece, portanto, que os empregadores quebram as promessas com bastante frequência, mas não reconhecem seus erros ou intervêm para oferecer uma solução.

Se você me engana, não devo ser vingativo?

Esse é o pensamento que muitos de nós temos.

Como essas promessas são uma parte tão central de seu contrato de trabalho, você sente que, quando elas são quebradas por seu empregador, você pode pegar o que é "legitimamente" seu.

Os funcionários que experimentam promessas não cumpridas tendem a passar por uma série de emoções negativas muito intensas, como raiva, frustração e indignação, que por sua vez levarão a um desejo maior de dominar, retaliar e se nivelar com o empregador.

Além disso, os pesquisadores descobriram que esse efeito era mais profundo entre aqueles que tinha um alto desempenho em seu trabalho e esperavam ser tratados de forma justa, o que significa que os melhores funcionários de uma organização são mais propensos a ser "vingativos" diante de promessas não cumpridas.

Outros estudos também evidenciaram que algumas pessoas parecem gostar de se comportar de forma vingativa, especialmente quando estão em um papel de status mais elevado e quando se sentem mais dominantes. Então, notamos que a combinação do "desejo de retaliar" e "desfrutar de encenação vingativa" leva a um reforço positivo desse comportamento.

Como consequência, é muito mais provável que os funcionários sejam vingativos no futuro quando forem confrontados com uma promessa quebrada, porque eles experimentaram principalmente consequências positivas de seu comportamento negativo.

Às vezes, não vale a pena fazer nada diante de uma promessa quebrada - BBC - BBC
Às vezes, não vale a pena fazer nada diante de uma promessa quebrada
Imagem: BBC

Nivelar-se é de curta duração

Isso significa que estou defendendo que você se comporte de forma vingativa quando seu empregador quebrar uma ou mais promessas? Claro que não. Permita-me explicar usando o acrônimo BRAIN (CÉREBRO, em inglês): Benefícios, Riscos, Alternativas, Informações e Nada.

Primeiro de tudo, quando você se vir diante de uma promessa quebrada, dê um passo atrás e reflita sobre os potenciais benefícios de ser vingativo, tendo em conta os riscos associados ao furto.

Embora possa parecer satisfatório tentar se igualar ao seu empregador que quebrou a promessa, sabemos que tal sentimento é de curta duração. De fato, é muito provável que você logo se sinta culpado por seu mau comportamento.

Você também corre o risco de ser pego e potencialmente perder seu emprego. Então, pergunte a si mesmo: "Vale a pena?" Em vez disso, pense nas alternativas!

Como já mencionei, seu empregador muitas vezes não tem consciência do fato de ter quebrado uma promessa com você. No entanto, estudos também constataram que você pode mudar a dinâmica dessa relação se você falar de maneira respeitosa.

Converse com seu empregador sobre a promessa que ele quebrou e sobre como isso afeta sua produtividade e, em última análise, o desempenho da empresa. Os empregadores geralmente respondem bem a esse tipo de diálogo - pelo menos em 52% a 66% dos casos - e tentam consertar as coisas pedindo desculpas ou oferecendo uma compensação.

No entanto, antes de fazer qualquer coisa, verifique se você tem todas as informações necessárias. Faça a si mesmo perguntas como:

"Essa promessa quebrada está além do controle do meu empregador?"

"Os colegas experimentaram a mesma promessa quebrada?"

"É a primeira vez que algo assim aconteceu comigo?"

Quanto mais informações você tiver, melhor será sua decisão: desistir de sua queixa, conversar sobre ela, pedir uma compensação, etc.

Estudos recentes revelaram que você tem mais probabilidade de desencadear uma reação, tal como receber um pedido de desculpas ou uma compensação, quando puder demonstrar ao seu empregador que ele/ela propositalmente quebrou sua promessa. Porque, ao fazer isso, você demonstra que eles têm controle sobre a situação e, portanto, podem corrigir seu comportamento errado.

Além disso, é mais provável que você receba um pedido de desculpas ou uma compensação se puder arregimentar outras pessoas que também experimentaram uma promessa quebrada parecida.

Finalmente, e antes de fazer qualquer coisa, pergunte-se: "Vale a pena?"

Às vezes, não vale a pena fazer nada diante de uma promessa quebrada. Não estou dizendo que você deva ficar calado quando testemunhar ou passar por injustiças no local de trabalho. Em vez disso, sugiro que você escolha suas batalhas.

Ou seja, você deve chegar à conclusão sobre quais aspectos do seu contrato de trabalho são inegociáveis e quais são bons para você, mas nem sempre necessários. Assim, você se protege para lidar com cada promessa quebrada.

Meu conselho é usar o seu cérebro ao ser confrontado com uma promessa quebrada em seu local de trabalho e saber que você pode conversar para receber um pedido de desculpas ou uma compensação em vez de surrupiar material de escritório.

*Yannick Griep é professor-assistente de psicologia organizacional e industrial da Universidade de Calgary, no Canadá. Este artigo foi publicado originalmente no site The Conversation