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Paulo Chaccur

É possível ter um coração jovem na terceira idade?

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Imagem: iStock

Colunista do UOL

23/12/2018 04h00

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A dúvida é comum: o coração envelhece? Por incrível que pareça, podemos encontrar indivíduos na terceira idade, não somente aos 60 anos, mas por volta dos 80, com corações em pleno bom funcionamento. As válvulas com dinâmica adequada, órgão de tamanho normal e artérias coronárias sem nenhum entupimento. E isso ocorre com certa frequência, pois não são todos os idosos que acabam tendo problemas no coração, como a insuficiência cardíaca.

Tudo dependerá muito do histórico clínico ao longo dos anos: se o indivíduo não apresentou pressão alta, nunca fumou ou não teve diabetes, por exemplo. Livre destes fatores de risco, o coração de certa forma será poupado, possibilitando que ele se mantenha normal por toda a vida. Ou seja, nestes pacientes, o órgão não aumenta de tamanho e nem perde a função. 

Por essa razão, vemos tantas pessoas idosas praticando exercícios. Hoje, quando se fala em qualidade de vida, o indivíduo tem a consciência de que, com o envelhecimento, perde-se muita massa muscular, então, o idoso está se habituando a adotar a atividade física no dia a dia, e não só a caminhada, mas um pouco de musculação, os exercícios com peso, buscando manter bem sua estrutura muscular.

Ao optar por exercícios orientados, especialmente quando o problema é articular, de coluna ou tendões, essa prática traz um bem-estar muito grande, como citei em artigos anteriores. A liberação de endorfina é igualmente benéfica ao idoso e essa população com certeza poderá ter mais tempo para fazer esse investimento no cotidiano. Quando isso passa a ser aplicado por pessoas conscientes da necessidade do movimento, vemos em consultório pacientes que praticam até 1h30 de atividade física diária.

Prevenção em grupo de risco

Para as pessoas que possuem algum fator de risco, as recomendações partem do histórico de saúde conhecido na última década. Quem fez adequadamente o seu acompanhamento ao longo desse período, quer seja um diabético ou um indivíduo que tenha hipertensão arterial, terá, sob orientação do cardiologista, a possibilidade de liberação para a prática de exercício diário.

O ideal seria que praticássemos atividade física todos os dias ou, pelo menos, quatro vezes na semana. Mas, para isso, estes idosos precisariam ter realizado acompanhamento médico constante. A parte preventiva é que permitirá ao indivíduo chegar na terceira idade, mesmo apresentando uma doença preexistente, com boa qualidade de vida. Mas isso só funciona para quem fez uma adequada prevenção ao longo dos anos.

O diabetes, nesse sentindo, é ponto primordial. Muitos pacientes não têm a consciência da gravidade da doença, das consequências geradas por uma situação de hiperglicemia. Os danos nos órgãos, nas artérias, no corpo todo, rins e retina são realmente graves. Muitas pessoas passam por avaliação cardiológica, recebem orientação, a prescrição dos medicamentos, mas verificamos que não há um rigor muito intenso por parte do diabético neste controle.

Quando avaliamos um paciente que realizou os exames clínicos, especialmente de avaliação metabólica, conseguimos identificar caso os indivíduos estejam com a doença mal controlada. O teste de hemoglobina glicada, além de dosar a glicose, consegue determinar o consumo médio de açúcar nos últimos meses. Se a pessoa diabética conseguir manter entre 6% e 6,5% de hemoglobina glicada, é sinal de que está mantendo um bom nível glicêmico neste período. Às vezes temos pacientes que acabam exagerando na dieta ou que acabam relaxando até mesmo na medicação, mantendo níveis entre 7% e 8,5%. Já vimos, infelizmente, pessoas com surpreendentes níveis de 10%.

Ameaça silenciosa

O cenário fica ainda mais preocupante porque o indivíduo acaba não sentindo os sintomas por um longo período e opta por se manter obeso, sem controlar adequadamente a alimentação. Ao fazer visitas esporádicas ao endocrinologista, acaba comendo um pouco mais de açúcar, muita fruta e excedem no carboidrato, ao invés de comer mais legumes e verduras. Muitas vezes o problema também pode estar no volume ingerido e na preferência por doces e chocolates, de forma geral.

Notamos uma inversão de prioridades: o diabético ingere esses alimentos altamente calóricos procurando um prazer momentâneo e se esquece de como eles fazem mal. E muitos deles não têm o hábito de controlar a glicemia com a frequência necessária. O paciente deveria ter esse controle rigoroso do nível de açúcar no sangue. Se a pessoa não seguir essas recomendações, dificilmente chegará à terceira idade com tanta facilidade. Sem essa preocupação, alguma complicação acaba surgindo como, por exemplo, o rim, que entra num processo de falência, com a necessidade de diálise.

Para o coração, a problemática é o entupimento das artérias. A doença arterial, o aneurisma de aorta e o entupimento de artérias da perna são parte do espectro de doenças da pessoa diabética. Ela dificilmente terá uma qualidade de vida tão boa comparativamente àquela na mesma situação, mas que se comportou de uma maneira mais rígida, controlando melhor o seu diabetes, e podendo usufruir de uma condição mais tranquila.

Afinal, por que, para algumas pessoas, existe a dificuldade em aderir ao tratamento de forma efetiva? No início, a tentativa é de não aceitar o diagnóstico. Existe uma certa negação em relação à doença, principalmente quando ela surge. Depois, boa parte delas acaba decidindo o próprio tratamento, fazendo de forma danosa a automedicação. No caso da hipertensão, não recorrem ao aparelho caseiro para avaliar, ao menos, duas ou três vezes na semana a sua pressão. Hoje em dia até mesmo no celular é possível ter essas avaliações rápidas. Pode não ser com a mesma precisão, mas funciona como um bom indicativo da situação.

Envelhecer bem

A recomendação anual para a consulta ao cardiologista é indicada apenas para os indivíduos até os 50 anos, desde que não tenham fatores de risco associados. Mas o idoso, mesmo aquele sem doenças, precisa de um acompanhamento com periodicidade menor, a cada 6 meses. Isso é importante também para que se sinta mais seguro e tranquilo, fazendo com que se mantenha sempre vigilante com a própria saúde.

Sem esse rigor, muitos deles esquecem de tomar os medicamentos para pressão alta, por exemplo. Ou quando acham que a pressão arterial está boa, não tomam o remédio com a prescrição correta. Essa nunca seria a condução adequada. Se o medicamento anti-hipertensivo corrigiu e adequou os níveis pressóricos, isso só irá se manter desde que o tratamento continue. À medida que o paciente interrompe, a pressão volta a subir. 

As pessoas hipertensas ficam preocupadas se o uso contínuo do remédio vai levar a uma diminuição muito acentuada da pressão e, por isso, conforme se sentem melhor, diminuem a medicação por conta própria. Caso o indivíduo comece a ter uma atividade mais intensa, uma dieta com controle de ingestão de sal maior, pode ser que a medicação seja mesmo excessiva. Mas, nesse caso, é importante o indivíduo ter um acompanhamento caseiro da condição da pressão e estar em constante contato com seu médico para os ajustes necessários. 

Para cada doente existe uma prescrição de medicamento anti-hipertensivo, assim como cada paciente diabético precisa acertar com seu médico a melhor forma de controle da glicemia. São fatores bem individualizados. Para quem está chegando à terceira idade ou quer pensar em qualidade de vida mesmo que ela pareça distante, a prevenção é a maneira mais sábia de proteger o coração.

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